23 setembro 2012

A Grande Conspiração


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"Há quase um ano que o venho escrevendo aqui: o programa económico deste Governo não se limita a tentar endireitar as contas públicas à custa de sacrifícios cuja insensibilidade e ineficácia são de bradar aos céus. Há também uma agenda escondida, que envolve uma vingança sobre a história, uma desforra de classe, quase uma alteração dos valores cívicos em que a Europa se funda.  A razão pela qual nada bate certo na política económica do Governo PSD (onde o CDS faz de ingénuo útil) não tem que ver apenas com ignorância, impreparação  e incompetência - o que já seria suficiente, por sí só. A razão  pela qual todos temos como um trágico desastre aquilo que o Governo  persiste  em classificar  como um sucesso, é que estamos a falar de coisas diferentes, de objectivos finais diferentes. Os portugueses - que aguentam tudo estoicamente há um ano, sem porem o dinheiro a salvo no estrangeiro  ou desatarem  a partir montras, como fazem os gregos - confiavam que, atravessado o Inferno, limpo o estado das suas célebres  "gorduras" e de todos os que , acima e abaixo, dele abusaram anos a fio,  poderiam ter de volta  um dia a economia, os empregos, as suas vidas. Porém, o objectivo de Passos Coelho e do seu quinteto de terroristas económicos (Gaspar, Moedas, António Borges, Braga de Macedo e Ferraz da Costa) é outro bem diferente: eles querem mudar o paradigma económico, mesmo que para tal tenham de destruir o país, como, aliás, estão a fazer. Fiel aos ensinamentos dos seus profetas americanos, esta extrema-direita económica que nos caiu em cima acredita que o Estado deve deixar de gastar recursos quem não garante retorno  e concentrar-se apenas em apoiar , ajudar, estimular e dar livre freio aos poucos negócios escolhidos  - que, assim, não poderão deixar de prosperar. Aquilo a que chamam "processo de ajustamento" da nossa economia é um caminho deliberado de abandono do que acham que não tem préstimo ou futuro: o emprego pago com salários decentes, os direitos do trabalho, as pequenas empresas que não exportam, a própria classe média que vive do trabalho. No fim do "ajustamento", ficarão apenas as grandes empresas financiadas por baixos salários ou instaladas nos antigos monopólios públicos com lucros garantidos, e uma multidão de emigrados ou de desempregado, prontos a trabalhar por qualquer preço e em quaisquer condições. Esse será o seu "sucesso" final."

 

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Miguel Sousa Tavares - Jornal Expresso de 22-Set-2012